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08 abril, 2023

O manga veio para ficar!

 

Findo o mês de Março os números revelam que o mercado editorial de BD continua por cá em alta. Foram mais de seis dezenas de novidades (62) que chegaram às prateleiras das livrarias até ao final do primeiro trimestre de 2023, e comparativamente com igual período do ano passado regista-se um crescimento de 38%, o que vem dar continuidade ao "período dourado" a que referi no meu artigo de balanço bedéfilo de 2022.

São excelentes noticias, mas o que eu quero registar agora aqui é um facto completamente inédito. No acumulado até Março, pela primeira vez, verificou-se que o total de novidades no género manga (31%) superou o número de lançamentos de banda desenhada de origem franco-belga (24%).

Já nem lhe chamo uma tendência, mas sim a confirmação do que já era observável nos últimos anos: que a literatura manga (e as suas variantes) vieram para ficar! A editora DEVIR abriu as portas e indicou o caminho, e o manga em Portugal encontra-se que no que diria ser em modo “bola de neve”, com cada vez mais novos lançamentos e novas editoras a apostarem neste segmento. Este ano já são oito editoras nacionais com edições manga, com a DEVIR, claro, destacadíssima das demais.

Ainda recentemente passei numa loja de uma conhecida distribuidora livreira, onde a banda desenhada reserva para si um espaço próprio, e para grande surpresa minha, no expositor de maior visibilidade, antes ocupado pelos álbuns de banda desenhada franco-belga encontra-se agora tomado (quase) na sua totalidade pelas edições portuguesas de manga. É o mercado a ditar a sua lei. Temáticas variadas, qualidade de argumentos e desenhos, preço capa acessível, elevado número de páginas são razões que justificam a popularidade do manga.  

A este ritmo, e tudo indica nesse sentido, e o final do ano ditará uma nova realidade: a literatura manga será o género em banda desenhada mais editado, mais vendido e mais lido em Portugal, destronado todos os outros que nos acompanharam desde sempre, em especial o franco-belga. 
 

17 dezembro, 2020

Qual a melhor aplicação para catalogar bd's?

Há uns dias atrás solicitei no «Grupo Banda Desenhada Portugal» recomendações sobre quais as melhores aplicações usadas para a gestão das bedetecas pessoais. Reuni bons contributos e sugestões. Hoje venho aqui dar nota das aplicações que experimentei e quais foram as que apresentaram os melhores resultados face ao pretendido.
 
Recordo que a ideia era catalogar a minha colecção de livros de banda desenhada, composta essencialmente em 99% por obras oriundas do mercado americano, brasileiro e português. O método de registo pretendido, para fugir ao trabalho da inserção manual, é por leitura óptica do código de barras/isbn da obra, com utilização do telemóvel. A condição é que todos os registos da base de dados fossem posteriormente exportáveis para um formato trabalhável em excel.
 
Basicamente todas as aplicações experimentadas apresentam funcionalidades semelhantes. A diferença faz-se na capacidade de cada uma em identificar e reunir a melhor informação sobre cada obra catalogada.

Todas as aplicações testadas foram descarregadas através da PlayStore da Google, sistema android portanto. Estas são as minhas impressões:
 
  • Book Catalogue – Aplicação gratuita. Na opção de “scan barcode/isbn” solicitou-me a instalação de um aplicativo. Achei desnecessário. Aplicação chumbada.
 
  • Goodreads – Aplicação gratuita. Obriga a registo de conta, com opção de ligação pelo facebook. No teste de leitura do código de barras/isbn não reconheceu qualquer dos diferentes livros que experimentei. Aplicação chumbada.
 
  • ISBN Reader – Aplicação gratuita. No teste de leitura do código de barras/isbn não reconheceu qualquer dos livros que experimentei. Aplicação chumbada.
 
  • Skoob – Aplicação gratuita. Obriga a registo de conta, com opção de ligação pelo facebook. No teste de leitura do código de barras/isbn não reconheceu qualquer dos livros que experimentei. Aplicação chumbada.
 
  • CLZ Comics – Aplicação com período gratuito de 7 dias de utilização. De grande eficácia e facilidade na leitura do código de barras/isbn de comics americanos. Disponibiliza as opções de capas variante e segundos prints. Contudo não reconheceu as publicações portuguesas e brasileiras. As obras ficam automaticamente organizadas por séries. A informação apresentada disponibiliza a capa, data de lançamento, editora, sinopse, autores, preço de capa, género. Houve uma boa comunicação e ajuda por parte do programador. Tem a possibilidade de exportar a base de dados em formato csv que pode ser transformada em formato xls. O seu único senão poderá eventualmente ser o seu custo de subscrição (€1,49 por mês ou € 14,99 por ano), mas que convenhamos é um valor simpático face às funcionalidades que disponibiliza. Ideal para colecções americanas. Aplicação aprovada (e já em uso). 
 
  • Handy Library – Aplicação gratuita. De fácil utilização. Boa leitura de código de barras/isbn. Reconheceu facilmente um grande número de obras portuguesas e algumas edições brasileiras. Algumas (nº reduzido)  tiveram que ser inseridas manualmente. Experimentei com edições francesas e identificou a obra sem, contudo, apresentar a respectiva capa. Não reconheceu as publicações americanas. Os registos ficam organizados por “estantes” de fácil consulta. A informação apresentada disponibiliza a capa, data de edição, editora, sinopse, autores, nº páginas. Tem a possibilidade de adicionar comentários à ficha da obra. A base de dados criada pode ser exportada em formato xls. Aplicação aprovada.
 
Em resumo, não existe, ou não encontrei, uma aplicação capaz de reunir do melhor dos mundos, mas recomendo, sem dúvida, as aplicações «CLZ Comics» (para edições americanas) e a «Handy Library» (para edições portuguesas e brasileiras). Pela facilidade de catalogação, pela fiabilidade em identificar correctamente as obras pelo isbn, pela informação disponibilizada em cada registo, por permitirem a exportação dos registos para excel, e porque as duas se complementam. Em conjunto, ficamos habilitados a catalogar edições dos mercados americano e europeu, e aqui em especial, as edições portuguesas. A organização da nossa bedeteca agradece!

27 dezembro, 2018

O Fim da Goody!

2018 fica indubitavelmente marcado pelo fim das operações da editora portuguesa GOODY. No último mês, os rumores começaram a circular, e a falta de notícias por parte da editora, outrora tão comunicativa, acentuaram a ideia que algo estava a correr mal. E o pior cenário confirmou-se agora em Dezembro. A revista PatoAventuras #4 (na imagem) fica como a última publicação da GOODY.

Com a sua insolvência é o fim, outra vez, das edições regulares da Disney e da Marvel em português. Consta que as razões deste triste desfecho prendem-se mais com o “buraco” nas contas da editora que a falência da distribuidora Distrinews II provocou do que com as vendas de revistas em banca. Mas a verdade é que não tem sido fácil a vida do Patinhas e do Homem-Aranha em Portugal!

A GOODY foi uma bela surpresa quando surgiu em Dezembro de 2012 com a «Comix». Após um longo interregno as revistas Disney portuguesas voltavam a surgir no mercado nacional. Atrás da «Comix» veio a «Hiper», a «Big», a «Disney Especial», e com as colecções do jornal Público, a banda desenhada desenhada estava de volta às bancas. Em 2013 fecha o ano com um total de 77 lançamentos.

Em 2014 alargou a sua oferta com a publicação da revista «Os Simpsons» e deu uma especial atenção ao público feminino com títulos como «Violetta» e «Real Life» e até a própria Minnie ganhou um título próprio como «Minnie e Amigos». Mas estas aventuras não foram bem-sucedidas e todos estes novos títulos foram cancelados no ano seguinte. Não obstante, 2014 fica como o seu melhor ano editorial com um total 99 revistas editadas.

Em 2015 é a vez da «Big» ficar pelo caminho com um total de 10 números.

Em meados de 2017, a GOODY procede a uma reorganização das suas publicações. São cancelados todos os títulos Disney, inclusive a «Comix» que tem a sua última edição no n.º 200. A diminuição das tiragens, os atrasos na publicação e as alterações das periodicidade da revista traçaram o fim desta rara longevidade. A oferta Disney passa a estar centrada em três revistas: «Mickey», «Donald» e «Tio Patinhas».  Mas a maior surpresa da GOODY será o anuncio do regresso das revistas Marvel ao mercado português, com os lançamento das séries «Homem-Aranha» e «Os Vingadores». O ano fecha com um total de 56 revistas.

E chegamos a 2018. A editora complementa a oferta mensal da Disney e da Marvel com a aposta em mini-séries, colecções de 3 a 5 revistas dedicadas a um única personagem ou série. As coisas aparentam estar a correr bem nas bancas. Surgem novos títulos da Marvel, como «X-Men» e «Marvel Especial». Todas as semanas havia uma a duas revistas novas. Chega Outubro, e sem aviso prévio todos os títulos da Marvel ficam suspensos. O primeiro número (de três) da mini-serie dedicada ao Demolidor fica com a última revista deste universo. As revistas Disney ainda continuaram a ir para as bancas até finais de Novembro. Até que a PatoAventuras n.º 4 fecha a bonita aventura desta editora. Foram 96 edições em 2018.

Para a história ficam os 6 anos de edição e as 462 publicações de banda desenhada, e previsivelmente um 2019 mais pobre nas bancas nacionais.

04 novembro, 2009

Bull Market

Quem na passada Segunda-feira, 2 de Novembro, trocou o televisor pelo monitor e o sintonizou num conhecido sítio de leilões on-line nacional, como eu fiz, só poderia pensar que a loucura tinha derrotado a crise. O motivo? Álbuns de BD que se valorizaram 186% em 45 minutos!!!

Toda a animação começou por volta das 22:15 quando os valores de licitação já rondavam os € 30. Foi então que um despique animado entre interessados começou, com as licitações a sucederem-se… 31, 36, 38, 42, 50, 51, 60, 73, 75, 76, 80, 82, 85 até que finalmente por volta das 23.00 o preço final ficou estabelecido em € 86. Impressionante! É verdade, eu participei como mero espectador.

Que álbuns é que estou a falar? Dois álbuns da colecção Spirou da Méribérica: “Perseguidos pelo Medo” edição de 1994 e “Raio Negro” edição de 1999.

Photobucket
(cliquem na imagem para aumentar)

É verdade que existem alguns álbuns em português que já atingiram o estatuto de raridade e que forçosamente a sua aquisição é bastante dispendiosa. Mas claro, falo de edições da década de 60, 70 ou 80 quanto muito, e de editoras com a Camarada, a Distri, a Bertrand ou Edições 70. Junta-se agora mais dois álbuns da Meribérica. Das duas uma, ou os bedéfilos devem estar doidos ou as edições em português de BD estão em alta!


Assim para quem gosta de saber estas curiosidades, e aferir de valores da BD, deixo aqui o registo dos valores finais, que consegui apurar, de algumas transacções realizadas nessa noite:

  • Spirou – “Perseguidos pelo Medo”, edição de 1994 da Meriberica – estado novo € 86,00
  • Spirou - “Raio Negro”, edição de 1999 da Meribérica – estado novo € 86,00
  • Alix – “O Cavalo de Troia”, edição de 1990 da Edições 70 – estado novo € 31,00
  • Valerian – “Nas terras programadas”, edição de 1982 da Meribérica – estado novo € 30,00
  • Túnicas Azuis – “A Recruta dos Azuis”, edição da Edinter - estado novo € 22,10
  • Túnicas Azuis – “Os Foras-da-lei”, edição da Edinter – estado novo € 21,50
 
Bons negócios!

15 abril, 2008

Mundo de Aventuras



Ao receber hoje pelo correio, um lote de revistas do "Mundo de Aventuras", adquirido recentemente, vieram também recordações da minha infância, quando com os meus 10, 11 anos descobri o mundo da banda desenhada. E se revista houve que contribuiu para essa descoberta, foi sem sombra de dúvidas o "Mundo de Aventuras". E posso dizer sem exagero que eu não lia, eu “devorava” as aventuras de tal forma, que bastava olhar para a capa da revista para saber qual a história publicada. Assim, numa de nostalgia, resolvi reproduzir aqui integralmente, até para memória futura, o texto (revisto) escrito, aquando da minha colaboração com o desactivado portal BDesenhada.com, sobre essa saudosa revista que foi o "Mundo de Aventuras".

Numa altura em que escasseiam revistas de banda desenhada de publicação regular em Portugal, e as que existem(?) lutam desesperadamente por se manter “à tona da água”, proponho um regresso ao passado, para uma leitura sobre talvez um dos mais importantes projectos editoriais da banda desenhada que se fez em Portugal, não só pela sua longevidade mas também porque ajudou a criar gerações de bedéfilos, que semanalmente acompanhavam um mundo novo de aventuras. Pessoalmente, esta publicação, na sua segunda série, é para mim uma das mais fortes referências bedéfilas da minha juventude.

Começou por ser publicado semanalmente à quinta-feira, inicialmente num formato de grandes dimensões (280x400) e chamava-se “O Mundo de Aventuras”. Tendo como primeiro director Mário de Aguiar, surgiu nas bancas portuguesas pela primeira vez no dia 18 de Agosto de 1949, com um preço de capa de 1$50, e logo na sua primeira folha dava início a uma história, uma aventura de um piloto de aviação chamado “Luís Ciclon”, cujo nome português foi curiosamente importado de Espanha para personagem “Steve Canyon” (nome original), criada por Milton Caniff, autor que ganhou notoriedade com a criação das aventuras de “Terry e os Piratas”.

Ao longo de quase 38 anos, o “Mundo de Aventuras” trouxe-nos os grandes clássicos da banda desenhada americana, permitindo descobrir personagens como o “Fantasma” de Lee Falk, “Rip Kirby” de Alex Raymond, “Príncipe Valente” de Harold Foster, “Cisco Kid” de José Luís Salinas, “Johnny Hazard” de Frank Robbins ou o já referido “Luís Ciclon” de Milton Caniff, para além de publicar banda desenhada europeia como “Garth” de Steve Dowling ou “Kit Carson” de Rino Albertarelli, entre muitos outros.

O aparecimento posterior de outros projectos, de igual qualidade, nomeadamente as revistas “Cavaleiro Andante” (em 1952) e “Tintin” (em 1968), que publicavam essencialmente banda desenhada de origem franco-belga, levaram que o “Mundo de Aventuras”, propriedade da sociedade Aguiar & Dias (Agência Portuguesa de Revistas), sofresse ao longo dos anos, alterações de vária ordem, sendo das mais visíveis as relacionadas com a sua dimensão, que passou do formato inicial de “jornal” para o formato final de “livro” e a publicação de histórias completas, sendo que antes estas encontravam-se repartidas por vários números. A título de curiosidade acrescenta-se que a partir do número 81, publicado em 1 de Março de 1951, o título deixou cair o “O” passando a designar-se apenas “Mundo de Aventuras”.

A partir da década de 50, na sequência da implementação de medidas de auto-regulamentação por parte de editoras americanas de banda desenhada, com a criação do famoso selo da “Comics Code Authority”, o “Mundo de Aventuras” torna-se em Portugal, a primeira publicação a adoptar estas orientações, passando a excluir séries consideradas como não juvenis. A censura, então vigente no nosso país, encarregou-se do resto, dedicando-se a truncar textos e vinhetas, chegando mesmo a tornar obrigatório que as personagens estrangeiras adoptassem nomes portugueses. Assim, “Rip Kirby” transformou-se em “Ruben Quirino”, “Prince Valiant” passou a “Príncipe Valente”, “Johnny Hazard” a “João Tempestade”, “Flash Gordon” a “Capitão Relâmpago”, “Big Ben Bolt” a “Luís Euripo”, Brick Bradford” a “Brigue Forte”, entre muitos outros caricatos exemplos.

O “Mundo de Aventuras” entre o período compreendido entre 1949 e 1987 passou pelo que se convencionou designar por duas séries. A primeira com início no primeiro número terminou em 20 de Setembro de 1973 com a publicação do número #1252. A segunda série, cuja numeração começou de novo no número #1, teve início em 4 de Outubro de 1973 e terminou no dia 15 de Janeiro de 1987, com a publicação do número #589, o número final.

Como actualmente já não existem projectos deste calibre, resta a memória e para aqueles que possuem revistas desta magnifica colecção, o prazer de ler e reler grandes aventuras, grandes clássicos da banda desenhada, em português.

Publicado originalmente no portal BDesenhada.com em 11-12-2006.

31 julho, 2006

O Mundo Lusitano das HQ's

Do outro lado do Oceano, Sónia Luyten, investigadora e autora brasileira que resolveu fazer o caminho inverso de Cabral e descobrir o que está por detrás do mundo lusitano das HQs. Publicou um interessante artigo sobre a "nossa" banda desenhada, que eu tomo a liberdade de o republicar aqui.
 

Portugal: das histórias aos quadradinhos às bandas desenhadas 

Por Sonia M. Bibe Luyten

No Brasil, falamos o idioma português. Também herdamos boa parte da cultura que Portugal trouxe após o descobrimento. Mas, em matéria de histórias em quadrinhos… mal nos conhecemos. Os fãs de HQ sabem mais sobre o Yellow Kid do que a respeito das Aventuras Sentimentais e Dramáticas do Senhor Simplício Baptista, publicado em 1850, muito antes do seu par norte-americano, em 1896.

As histórias aos quadradinhos ou bandas desenhadas portuguesas possuem uma riqueza e abundância de histórias e autores e uma bibliografia especializada no assunto tão grande, que é de fazer inveja para qualquer um que se dedique ao assunto. Por isso, em dois (ou mais) capítulos vamos fazer o caminho inverso de Cabral e descobrir o que está por detrás do mundo lusitano das HQs.

Dos pioneiros de 1850 aos artistas maduros da década de 1940

A produção das histórias aos quadradinhos, como eram denominadas em Portugal em seu primeiro século de existência, começa em 1850, com a publicação da primeira história de Aventuras Sentimentaes e Dramáticas do Senhor Simplício Baptista, assinada por Flora, provavelmente o pseudônimo de Antônio Nogueira da Silva, um dos mais importantes caricaturistas desta época.

Esta história em seqüência de quatro vinhetas, ou em tiras de duas vinhetas, apareceu no número 18 da Revista Popular, no dia 3 de agosto de 1850, atingindo todos os requisitos para se considerar uma HQ. 

No entanto, o maior artista gráfico português do século XIX e início do XX foi Raphael Bordallo Pinheiro (1846 – 1905). Ele pintou e bordou como ninguém em sua época. Chegou até a passar uma temporada no Brasil e, em 1875, tornou-se grande amigo de Angelo Agostini, o nosso grande pioneiro das HQs, com as Aventuras de Nhô Quim, em 1869. 

Raphael Bordallo, além de ilustrações, caricaturas, desenhos e quadrinhos, tinha também uma fábrica de cerâmica e seus artefatos neste campo ficaram tão famosos quanto suas obras gráficas. Entre 1870 e 71, ele iniciou sua revolução na ilustração gráfica portuguesa nas revistas A Berlinda e O Binóculo.

Já em 1872, ele transpôs as fronteiras com seu álbum Apontamentos de Raphael Bordallo Pinheiro sobre a Picaresca Viagem do Imperador Rasilb pela Europa. “Rasilb” é um anagrama de “Brasil” e o personagem principal era o próprio Imperador Dom Pedro II, que passou parte considerável de seu longo reinado viajando pelo mundo, o que o tornou um alvo de chacota do artista português, liberal e anti-monarquista.

Ao lado de Eça de Queirós, Raphael Bordallo Pinheiro foi uma das grandes figuras da famosa “Geração de Setenta” (anos 70 do século XIX), que é considerada a grande criadora de caricaturas nacionais. Da criatividade de Eça surgiu o famoso Conselheiro Acácio; e de Raphael, o Zé Povinho, criado nas páginas da revista Lanterna Mágica, em 1874, e que tornou-se o maior acontecimento de toda a produção satírica portuguesa.

O Zé Povinho, até hoje, é um personagem emblemático, uma representação simbólica – ainda que caricatural – da personalidade lusa, desde o século XIX até os dias atuais. Só a respeito de Raphael Bordallo, foram publicados inúmeros livros e artigos; e sua contribuição para as artes gráficas encanta até hoje. Os quadrinhos portugueses foram muito precoces também no segmento infantil, com publicações como O Amigo da Infância, editada pela Igreja Evangélica Portuguesa, de 1874 a 1840; e Recreio Infantil, de 1874 a 1876.

Outras revistas para crianças foram: Jornal da Infância (1883), O Gafanhoto (1903). Aliás, neste último caso, o personagem homônimo, que deu nome à revista, tornou-se o primeiro grande herói dos quadrinhos infantis portugueses.

Por outro lado, no mesmo período, também já apareciam quadrinhos eróticos como A Chacota (1882) e O Pimpão (1879). O período que vai de 1910 a 1940 é considerado a era artística do quadrinho português. Isso quer dizer que as produções do gênero eram fruto de um trabalho individual aprimorado. Como grande exemplo destes tempos, citamos Stuart Carvalhais (1887 – 1961). Ele é considerado o verdadeiro criador dos quadrinhos portugueses quando publica, em 1915, a história de Quim e Manecas, na revista Século Comico.

Tratam-se das peripécias de dois malandros, tipicamente anarquistas juvenis; e seu aparecimento coincide com a mudança política do autor, quando abandona seus ideais monarquistas e passa a apoiar a república. Stuart Carvalhais era polivalente. Trabalhou em todos os setores de artes gráficas e, na área de quadrinhos, em praticamente todas as revistas e jornais de sua época.

Na década de 1920, aparece uma revista decisiva no cenário português, o ABC-zinho. Lançada por Stuart Carvalhais, contou com a preciosa colaboração de Cotinelli Telmo (1897 – 1948) e virou uma referência obrigatória para todos os que se interessam pelo quadrinho lusitano. Ainda mais influente do que o ABC-zinho foi O Mosquito, criado em 1936, e que durou até 1977. Nesta revista colaborou uma plêiade de grandes artistas, como Eduardo Teixeira Coelho (E.T.Coelho), José Garcez e Jayme Cortez.

A vez do público juvenil

O sucesso da revista infantil ABC-zinho fez ver aos editores a viabilidade de uma imprensa periódica juvenil. E, entre as décadas de 1920 e 1930, inúmeros títulos, uns duradouros, outros não, chegavam às mãos da moçada lusitana. Revistas como O Carlitos, O Senhor Doutor, e suplementos encartados nos jornais como Có-Có-Ró-Có (do Diário de Notícias) e Tic-Tac, eram publicadas em diversas cidades de Portugal, trazendo os maiores desenhistas deste período.

Além disso, nos anos compreendidos entre as duas Grandes Guerras, os próprios portugueses diziam que houve tanta proliferação de revistas humorísticas, quanto o número de tendências e partidos políticos. Na década de 1930, aparece a revista O Papagaio, da imprensa católica infantil, por onde passaram outros bons nomes do desenho, como Tom (um carioca que imigrou para Portugal aos 20 anos), José de Lemos, Júlio Resende, Arcindo Madeira e muitos outros.

Houve ainda dois acontecimentos que fizeram com que a produção de quadrinhos portugueses tomasse um rumo ainda mais firme. O primeiro foi durante a Segunda Guerra Mundial, na qual Portugal manteve neutralidade absoluta, mas proibiu a publicação de quadrinhos estrangeiros. Desta maneira, o país se manteve livre da avassaladora influência norte-americana, o que motivou o aparecimento de novos artistas e séries e difundiram hábitos de leitura.

Logo depois da vitória dos aliados, com o fortalecimento da ditadura salazarista, aprovou-se uma lei exigindo que 75% das histórias em quadrinhos publicadas fossem de origem portuguesa. Dessa maneira, não é preciso perguntar por que as histórias aos quadradinhos tiveram tanta força em Portugal, apesar da censura. Aliás, sabemos nós, aqui no Brasil, que a censura política aguça ainda mais o espírito criador dos artistas.

Mas nem todos os desenhistas sentiam-se muito felizes com o regime ditatorial, e um dos mais importantes deles, Jayme Cortez, resolveu imigrar para o Brasil, em 1947. Aqui, ele se tornou um grande mestre para muitos artistas brasileiros e trabalhou em diversos órgãos, além de dar assistência para jovens da época como Mauricio de Sousa. Juntamente com Jayme Cortez veremos um grupo de desenhistas como Eduardo Teixeira Coelho, Fernando Bento, António Barata, José Rodrigues Neves, José Ruy, José Garcês e Vítor Péon, que consolidaram os quadrinhos em Portugal. O peso deles é tão forte, que a “Escola Portuguesa” das HQs começa aí.