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27 dezembro, 2013

Leitura: Rugas, de Paco Roca

Nota introdutória:
Todos os anos, no inicio de cada, e relativamente ao anterior, em jeito de balanço escrevo a rubrica «revista do ano». Aqui tenho por hábito elaborar uma selectiva lista (5) daquelas bandas desenhadas, cuja leitura, quer seja pela história, quer seja pelo desenho, quer seja por ambos, me deu grande satisfação, motivo pelas quais as elejo como «leituras do ano».

No entanto, nem sempre escrevo aqui no blogue sobre essas leituras, pelo que fica se calhar a faltar qualquer coisa. Assim este ano vou fazer as coisas de forma diferente. A ideia é publicar aqui os cinco textos correspondente às minhas cinco leituras do ano de 2013. Basicamente a razão das minhas escolhas. Sem qualquer ordem especifica, segue-se a primeira: RUGAS



RUGAS do autor espanhol Paco Roca (edição Bertrand) foi uma das minhas primeiras leituras e desde logo uma das melhores. É uma história com uma dimensão humana como poucas histórias em banda desenhada alcançarão. Acompanhamos Emílio. Bancário reformado é portador da doença de doença de Alzheimer. É através dele que entramos numa triste realidade chamada lar de terceira idade. Logo nas primeiras páginas, o autor castiga o leitor com a imagem de alguém que é largado pelo filho naquela que é a sua última paragem antes do fim. Ainda que o tema principal da história seja a doença de Alzheimer, Paco Roca consegue uma articulação entre a doença, a velhice e a amizade, numa abordagem realista com uma linguagem simples mas profunda.


Um destes dias, uma amiga minha contava-me que uma tia dela, com o início da doença, brincava com a situação dizendo que umas das vantagens de se ter Alzheimer, era conhecer novas pessoas todos os dias. É quase no mesmo tom divertido que Paco Rosa aborda aqui a doença. Começa logo pela excelência do desenho da capa desdobrável. A composição gráfica que mostra as memórias de uma vida (representadas pelas fotografias), ao longo de uma viagem de comboio (não poderia haver maior simbolismo) vão saindo desaparecendo da cabeça de Emílio, que mostrando um ar sereno se mostra incapaz de reagir, é de uma singularidade extraordinária.

RUGAS funciona como uma espécie de diário da vivência (e decadência até à chegada do "longo adeus") de Emílio no lar. Numa instituição onde no dia-a-dia todos os dias são iguais, somos apresentados a um universo de personagens (seniores) peculiar e representativas (inspiradas em casos reais) que compõem todo um quadro, e com as quais o autor consegue pautar um arco narrativo de situações que inevitavelmente causam algum desconforto, com bons momento de humor.

Mas RUGAS não conta só uma boa história, serve igualmente de critica social. E é na personagem Miguel, o companheiro de quarto de Emílio, e com quem Emílio divide o protagonismo na história, que o autor faz o "abanar" de consciências, ao dotar-lhe de um cinismo desconcertante, que lhe permite por exemplo definir os velhos como "fardos inúteis da sociedade" (pag. 35) e simultaneamente de uma generosidade e amizade que no final surpreende o leitor.


RUGAS é assim uma obra que olha com respeito para o principio do fim, traduzindo-se num bonito e critico ensaio sobre a velhice, o qual dá gosto ler, o qual dá gosto emocionar. Não há como não gostar.


Rugas
De Paco Roca
Bertrand Editora, 1ª edição de Março de 2013




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