Retomo aqui a rúbrica das leituras com o mais recente álbum de Asterix. O 35º álbum de aventuras foi talvez um dos álbuns de banda desenhada mais esperados do ano. Diz o incrível número de cinco milhões de exemplares de tiragem global. A mudança de autores verificada numa das séries mais populares no universo da banda desenhada fez crescer grandes espectativas. E não era uma herança fácil a responsabilidade assumida por Jean-Yves Ferri, no argumento e Didier Conrad, no desenho, em substituir Goscinny e Uderzo.
A verdade é que a leitura deste Asterix entre os Pictos não desilude mas também não entusiasma. Fico-me pelo meio termo. A premissa de uma viagem à terra dos pictos, leia-se Escócia, prometia uma boa aventura, a julgar pela história e cultura deste país. Um «picto» congelado dá à costa na Gália e os nosso heróis ficam encarregados de o levar de regresso ao seu país, acabando por interferir na eleição do novo rei dos Pictos. O argumento sem grandes rasgos de inspiração mostra-se competente q.b. Começa por revisitar os lugares-comuns na aldeia gaulesa. Não falta um piscar de olho à actualidade politica francesa com a questão do «direito de asilo» nas palavras do chefe Abraracourcix Matasétix com a resposta de imediato da esposa Bonemine Boapinta. Chegada a hora da verdadeira aventura começar, numa viagem de barco até à Caledónia, não falta o habitual encontro com os piratas, com o desfecho sobejamente conhecido.
E aqui chegados, enquanto leitores facilmente identificamos algumas das referências que a Escócia pode oferecer. Os clãs, a "lontra" de Loch Ness, a água de malte (leia-se whisky). Os trocadilhos com a linguagem pictograma mostram-se bem conseguidos. Mas os pictos revelam-se umas personagens mal caracterizadas, desenxabidas, o que não ajuda na história. Falta talvez uma alusão a Mel Gibson com o «seu» Braveheart, e faria depois todo o sentido que em vez de uma sugestão de aliança dos Pictos com os romanos para uma invasão da Gália(!), tivesse existido uma ameaça de invasão à Bretanha conhecendo-se a animosidade histórica entre escoceses e ingleses. As referência às musicas dos Beatles feita pela personagem principal do pictos, o Mac Brasa, também me parecem desenquadradas. No final, desmascarado o vilão, Mac Abro, salva-se as lutas contra os romanos e fecha-se com tradicional banquete.
No desenho, Conrad cumpre com o exigido. Mantem um registo gráfico fiel e nisso substitui Uderzo sem grandes problemas. Boa dinâmica do desenho e isso traduz-se num resultado final globalmente muito bom.
Asterix entre os Pictos mostra-se assim um álbum sem grandes ambições, onde claramente os autores podiam ter sido mais audazes. Jogaram pelo seguro e garantem uma leitura divertida. Com isto tem o mérito de fazer esquecer os álbuns anteriores, pelo menos os dois últimos, e trazer os irredutíveis gauleses de volta aos leitores. E isso faz deste álbum uma boa excelente noticia.
Asterix entre os Pictos
Autores: Jean-Yves Ferri e Didier Conrad
Volume 35, cores, capa dura
Editora ASA, 1ª edição de Outubro de 2013