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06 junho, 2025

E a BD portuguesa escreveu mais uma bela página!

Não podia deixar de registar aqui o belo acontecimento ontem, ao final da tarde, no Salão Nobre da CM Lisboa, onde numa cerimónia cheia de público, entre familiares e amigos, e de pompa, o autor Luís Louro foi agraciado com a medalha municipal de mérito cultural atribuída pelo município lisboeta, na pessoa do presidente Carlos Moedas. 

Um justo reconhecimento a um belo autor de banda desenhada que celebra este ano quatro décadas de carreira, e que fez, e certamente continuará a fazer, da cidade de Lisboa a tela das suas história mais emblemáticas. Belas palavras do presidente Carlos Moedas, que percebeu-se que fez o trabalho de casa, ao conseguir estabelecer uma ligação entre as obras do Luís e a cidade de Lisboa, citando obras como Alice, Corvo, Watchers. E magnifico sentido de humor do homenageado no seu discurso de agradecimento. 

Sentimo-nos todos bem representados em mais uma bela página que foi escrita na história da Banda Desenhada portuguesa.

Parabéns Luís! Obrigado Lisboa! 


28 abril, 2025

O universo de Luis Louro expande-se para a filatelia!

 O Francisco Lyon esteve no Coimbra BD e conta como foi este lançamento filatélico...

Os CTT lançam no Coimbra BD 2025 a Booklet de selos personalizados comemorativa dos
40 anos de carreira de Luís Louro e do Louroverso
 

Foi lançado dia 26 de Abril, no Convento São Francisco, no âmbito do Festival Coimbra BD 2025, uma Booklet de selos personalizados comemorativos dos 40 anos de Louroverso.

São quatro selos autoadesivos que retratam quatro dos personagens maiores criados para Banda Desenhada por Luís Louro – Jim del Monaco, O Corvo, Alice e O Corvinho.

Trabalhando em estreita colaboração com o autor, o Gabinete de Filatelia dos CTT lança a Booklet de dupla face na qual, em um dos lados, podem encontrar um texto de apresentação do conhecido autor e os respectivos selos e, na outra face, um desenho criado propositadamente por Luís Louro. Nele podemos observar uma Lisboa retro futurista repleta de referências para os mais atentos. Num último plano, O Corvo, como é seu hábito, anda pelos telhados da cidade com Robim, o seu fiel companheiro. O autocarro, o polícia sinaleiro e o carteiro vestido a rigor remetem para tempos idos. Pendurado numa empena, o antigo logotipo dos CTT. Um dos transeuntes é Fernando Pessoa e o homem de portfólio debaixo do braço, para quem não o conhece, é o próprio Luís Louro.

A cerimónia de lançamento, sob o tema “Mais vale selo que parecê-lo”, decorreu no salão nobre do Coimbra BD pelas 15h30 e a apresentação esteve a cargo da Dra. Lurdes Além, Directora de Marketing e Vendas do Gabinete de Filatelia dos CTT, Dr. Miguel Cruz, presidente da Infraestruturas de Portugal e vice-presidente da Infraestruturas da União Europeia, Francisco Lyon de Castro, este vosso correspondente, e Luís Louro, o homenageado.

Seguiu-se a cerimónia de obliteração que reproduz aquela que aconteceu em 1853, aquando do lançamento dos primeiros selos postais com o perfil da Rainha D. Maria II desenhado pelo seu marido, o rei consorte D. Fernando de Saxe-Coburgo.

Seguindo o preceito, carimbaram-se (obliteração) 5 envelopes com os selos do Louroverso que receberam as assinaturas de Luís Louro, Dr. Miguel Cruz e Francisco Lyon de Castro, sendo que o quinto envelope integrará o espólio do Museu dos CTT.

Para além de irem fazer as delícias de filatelistas e fãs de Luís Louro, os selos estarão em circulação até 31 de Dezembro de 2027.

 

24 abril, 2025

Os Filhos de Baba Yaga pelo olhar de Francisco Lyon

 

No ano da morte do Papa…


Há efemérides que deveriam ser comemoradas com pompa e circunstância e não o são. Vejam o caso de Luís Vaz de Camões, cujo 500.º aniversário se comemorou o ano passado. É certo que se fez alguma coisa, mas, quanto a mim, não o suficiente.

Curiosamente, 2024 foi também o ano de outro aniversário especial, o do Corvo. Esse herói da Grande Alface, maior que a vida, celebrou os 30 anos de existência. Trinta anos desde que foi criado pela mente imparável de Luís Louro.


Ora, é Luís Louro que comemora em 2025 os seus 40 anos de carreira. As comemorações serão muitas e a vários níveis. Mas aquela que mais justifica a sua carreira é, precisamente, a nova obra.


Não é gratuitamente que afirmo que Luís Louro tem uma mente imparável. O homem parece que só está bem a escrever e a desenhar. Só está bem quando desenvolve um novo projecto.


Mas alguém que não pára e produz de forma quase alucinada, corre o risco de não ter tempo para evoluir. Cristalizar a sua caneta e a sua pena é o perigo!


Mas sosseguem os que o admiram e chorem os que dele desgostam. Ainda não é desta que Luís Louro surpreende pela negativa.


Os Filhos de Baba Yaga, pois é esse o título da sua nova obra, não vê a acção nas selvas de Jim del Monaco, na Lisboa submersa de Alice, na “Grande Alface” do Corvo ou nos bosques encantados de Dante. Agora o assunto é sério (como se os outros não fossem)!


Estamos em plena Segunda Guerra Mundial. Hitler acaba de quebrar o Pacto Molotov-Ribbentrop, mais conhecido por Pacto Germano-Soviético, e ordena a invasão da União Soviética. É a famigerada Operação Barbarossa, iniciada em Junho de 1941, e o ponto de viragem do ímpeto germânico. O ataque brutal a Kiev, o cerco desumano de Leninegrado, a invasão completa da Ucrânia, da Bielorrússia e dos Países Bálticos não dá, ainda assim, a vitória às Forças do Eixo. As baixas de ambos os lados são astronómicas. Do lado alemão, mais de 200 mil mortos e 655 mil feridos; do lado soviético, mais de 800 mil mortos, 3 milhões de feridos e mais de 3 milhões de capturados que acabariam mortos. Os bosques, as infindáveis planícies de cereais, as cidades, o campo, tudo está devastado. Grassa a fome e a doença.


E é neste preciso momento que vamos encontrar o grupo de protagonistas de Os Filhos de Baba Yaga, a novela gráfica de Luís Louro que acaba de ser publicada numa parceria A Seita/Arte de Autor, na chancela exclusiva do autor Folha de Louro. Uma edição de luxo, com prefácio de David Soares, um caderno de 14 páginas de extras, com as capas das duas edições, uma entrevista ao autor realizada por João Miguel Lameiras e, para delírio dos fãs, inúmeros esboços, estudos de personagens e um making of. Além disso, para os mais afortunados, a edição feita para a Wook, para além de ter uma capa diferente, tem também um ex-libris autografado pelo autor, o mesmo acontecendo com os primeiros exemplares vendidos online pelas editoras.


Tudo falado e circunstanciado…


Vamos à história!

 

A águia poisada no galho da árvore olha em redor, majestática. Abaixo dela, uma campa improvisada assinala a morte de um soldado desconhecido da Wehrmacht. O pássaro imponente levanta voo e sobrevoa os campos de cereais feridos, aqui e ali, por quedas de obuses e ataques a carros de combate. Uma lebre é perseguida pela águia e esta, num voo picado, não deixa escapar a presa. Não fossem os despojos de guerra, o Outono pareceria correr o seu rumo natural, meigo e acolhedor. Pelo menos, para as águias.

 

O Panzer IV fora abandonado pela sua tripulação. Faltou-lhe o combustível. Esse era um dos muitos problemas enfrentados em solo soviético pelas tropas alemãs.


Agora é ocupado pelo grupo de crianças órfãs que o utilizam para as suas brincadeiras inocentes, mesmo que estas sejam brincar às guerras. Vassili, o que tem o estômago mais fraco, solta um gás. Afinal, o grupo anda a comer erva há vários dias. Para os miúdos, é como se tivessem lançado uma granada dentro do carro de combate. É vê-los a fugir por cada escotilha, para bem longe do cheiro nauseabundo.


O grupo é composto por dez membros. O Vassili, a Tatiana (a mais pequena), Nikita e Alexei (os gémeos), Vadim (o fumador), o Yevgeny (sempre com a sua máscara de gás), o Yury (o gordo zarolho), Volodya, Oleg e Olga (a mais velha). E é esta que acaba de trazer para o grupo um novo membro, Kolya, que reúne as condições indispensáveis para ser aceite por aquela estranha trupe: ser órfão e trazer alguma coisa para benefício de todos.

 


A fome aperta e as crianças resolvem aproveitar aquilo que Kolya trouxe para o grupo – ele sabe onde fica uma quinta que ainda tem comida. Basta ir lá roubar alguma. Cabe a Vadim e Kolya fazerem o assalto à propriedade. São bem-sucedidos. Não só trazem mochilas carregadas de ovos frescos como um novo membro para o grupo, a galinha Svetlana.

 

Mas os tempos de inocência estão prestes a terminar. As chuvas torrenciais anunciam a chegada iminente do Inverno. E os nevões que se seguem provam-lhes que o gélido general acabou de se instalar.

 

O grupo não tem comida nem abrigo. E, por questões de segurança, vê-se obrigado a manter-se em constante movimento. A situação das crianças é desoladora. Mas não lhes corre nas veias o sangue dos cobardes e dos desistentes. Em prol do grupo vão fazer tudo para sobreviverem. Mesmo tudo! Afinal, camponeses e os exércitos dos dois lados já os chamam de “Os Filhos de Baba Yaga”.

 


Para os países anglófilos, uma novela gráfica é um tipo de obra que combina palavras e desenhos, não se podendo confundir com uma publicação periódica (comic), e contendo uma história completa. Em termos literários, para os europeus, uma novela é uma narrativa que se situa entre o conto (mais curto) e o romance (mais extenso). Agora, juntem-lhe o “gráfico” e “história completa” e têm, na verdadeira acepção do termo, Os filhos de Baba Yaga, a nova novela gráfica de Luís Louro.

 

Desde logo, há que dizer que estamos aqui perante uma cuidada e inteligente narrativa que tem na intensidade da mensagem um dos seus grandes trunfos. Sendo o outro a capacidade renovadora do autor em termos narrativos e gráficos.

 

O resumo redutor da obra diria que se trata da história de um grupo de crianças que tenta sobreviver, por todos os meios, aos horrores da guerra; neste caso, a Segunda Guerra Mundial. Não deixando de ser verdade, limita tanto a percepção da história como qualquer comentário que diga que as aventuras de O Corvo são, exclusivamente, obras de humor, pondo de parte a densidade psicológica do protagonista bem como os assuntos sociais abordados.

 

A intensidade de Os Filhos de Baba Yaga reside no facto de termos onze crianças órfãs, entre os 5 e os 13 anos de idade, que são obrigadas a arranjar maneira de sobreviverem sozinhas, sem qualquer ajuda e, para além disso, em tempo de guerra. Mais ainda, a acção decorre na passagem do Outono para o Inverno, sendo esta mudança de estação sinónimo não só do agravar das condições de sobrevivência, mas também o prenúncio da evolução das crianças para a monstruosidade.

 


Os Filhos de Baba Yaga é, por isso, uma novela de crescimento e descoberta, sendo que nem sempre se cresce para o lado certo.


Em certa medida, até lembra The Body, a obra de Stephen King que deu origem ao magnífico filme Stand by Me (Conta Comigo, na versão portuguesa). Em ambos os casos há uma viagem de crescimento, um ambiente adverso e muita camaradagem. E até há um narrador-personagem de posição subjectiva, autodiegético. O que faz diferir as duas obras (para além do evidente) é a mensagem. Na de King, uma aventura de Verão vai definir o carácter futuro de quatro rapazes. Na de Louro, o futuro tem um alcance curto, as personalidades formam-se rapidamente e do mesmo modo se extinguem, e até a camaradagem degenera. A excepção é o narrador que, mais tarde, tem tempo para crescer e iniciar nova viagem, agora de redenção. Se Stephen King lê-se português, ficaria com inveja. Ou, pelo menos, desejaria apadrinhar o jovem Luís Louro.


Esta narrativa de Louro tem o mérito (como a maior parte das suas obras) de esconder a complexidade através da aparente simplicidade.


Desde logo, o tempo que corre a dois tempos. O tempo de cada acção é constantemente minado por pequenas prolepses quase imperceptíveis. O resultado é um desenvolver da história equilibrado durante a qual passam Outono e Inverno sem que o leitor sinta que tudo foi feito a correr. E, por outro lado, não sentimos que a história se arraste. O controle do tempo é coisa importante para um escritor e o Louro fá-lo na perfeição. Deste modo, nada se sente extemporâneo ou inverosímil. Não ficamos por isso chocados com o momento em que as crianças passam de “bons selvagens” para demónios. Choca-nos que se transformem em demónios, mas não o momento em que tal acontece.

 

 

Já sabemos que o grupo de crianças vai fazer de tudo para sobreviver à guerra e ao Inverno. Mas, ainda em termos de complexidade, Luís Louro não se limita a colocar os órfãos em situações extremas. Antes lhes limpa as almas de quaisquer resquícios de humanidade e os faz viver numa espécie de apatia amoral. Nesse sentido, vejam o pormenor da pequena Tatiana, cheia de frio, a aquecer as mãos no calor emitido por um cadáver a arder. E reparem como o rosto dela nos mostra um terno consolo. Os valores humanos são completamente invertidos, não tanto pelo acto, mas pela expressão no rosto da criança. E este é apenas um exemplo de muitos que pontuam a obra.

 

Os Filhos de Baba Yaga é uma obra muito dura. Diria mesmo cruel. A violência é levada ao extremo, embora sem gratuitidades. E as crianças não fazem disso um drama. São coisas que têm de acontecer. Ou na sequência de brincadeiras ou por pura necessidade, mas sem quaisquer dilemas ou remorsos. E os “pobres” miúdos crescem para a monstruosidade e comungam, felizes, o facto de serem considerados os filhos de um dos mais terríveis, ambíguos e enigmáticos seres do folclore eslavo – a “bruxa” Baba Yaga.

 


Como disse acima, a narrativa é cuidada, inteligente e tem um dos seus trunfos na intensidade da mensagem. Mas dessa falarei no fim.


O outro trunfo é a capacidade de Luís Louro de se renovar em termos narrativos e gráficos.


Para os leitores habituais do autor não será surpresa a narrativa andar intimamente a par com o grafismo; afinal, argumentista e desenhador são um só.


Mas nunca Luís Louro conseguiu casar tão bem uma e outro, a que teremos de acrescentar outra das suas artes maiores – a colorização.


Não só a história é original (esqueçamos O Deus das Moscas, de Golding), como quase nos leva à loucura. “Como é possível crianças chegarem a este ponto?”, perguntar-se-á o leitor. E a questão é tão pertinente num cenário da Segunda Guerra Mundial como é agora na Ucrânia ou na Palestina. Sem pretensiosismos, Luís Louro não fala apenas para os fãs ou amantes de Banda Desenhada. Com Os Filhos de Baba Yaga, Luís Louro fala para o mundo… com uma linguagem verdadeiramente universal.


E o narrador surge como uma espécie de Jiminy Cricket ou Grilo Falante, com funções de ser a consciência do leitor. Com este subterfúgio narrativo, Louro consegue a empatia do leitor, o desespero do leitor, a admiração do leitor. História e narrativa gravam-se de modo indelével nas nossas mentes. Ainda para mais porque a história é esta, não sujeita a continuações ou reviravoltas em tertúlias pós-leitura. Se nos sentimos amargurados, é para sempre! Se nos sentimos esperançosos, para sempre será!

 

Não ficando satisfeito com a evolução da sua escrita, Luís Louro decide também passar a sua arte ao patamar seguinte (digo-o assim pois não sei quantos mais patamares irá subir nas próximas obras).
 
Os leitores habituais do autor reconhecerão, aqui e ali, o seu traço característico. Mas são esses mesmo leitores que mais facilmente perceberão o evoluir da arte. Esta tornou-se mais realista, sobretudo nos décors e no “desenho técnico” de armas e carros de combate. Atentem no pormenor do Panzer que se segue e no trabalho que o autor teve com as lagartas.


Mas o mesmo acontece com os uniformes dos soldados, as indumentárias dos miúdos e os acessórios que utilizam. E se o traço do autor é mais reconhecível no rosto dos personagens, mesmo aí há uma evolução para um certo realismo.


Imaginem agora o que é criar 11 protagonistas, todos com características faciais distintas, cada um com a sua roupagem e acessórios. Sem dúvida, este deve ter sido um dos álbuns de Louro que lhe deu mais trabalho.


Se a isto juntarmos as inúmeras camadas de cores e efeitos que coloca em cada vinheta, percebemos que Os Filhos de Baba Yaga é uma história de amor entre autor e a sua nova obra.


Para que tenham uma noção do que falo, observem a próxima imagem. São mais de 50 layers (camadas) aplicadas na vinheta, incluindo a ferrugem que mal se detecta no carro de combate (são os preciosismos do Louro).

 

Falando de preciosismos do autor, podemos falar também do seu gosto pelo detalhe e por criar cenas complexas, com a possibilidade de múltiplas leituras. Neste álbum, o leitor é brindado com uma série de imagens em página dupla que farão não só as suas delícias como serão dignas representantes da arte do autor em qualquer exposição.


Nesse sentido, vejam as duas imagens que se seguem. Na primeira temos uma cena de caos, de destruição total, em vários planos. Num primeiro plano, um dos miúdos parece de guarda a um cano de esgoto cujos fluídos congelaram e o uniram ao rio. No mesmo plano, um carro de combate russo destruído. Num segundo plano, temos a ponte vítima de um ataque e dois dos miúdos debaixo dela. Num terceiro plano, o bosque circundante começa a arder e colunas de fumo enegrecem os céus. E, por fim, dois aviões, parecem afastar-se, apáticos, da destruição que causaram.


Na segunda imagem temos, aparentemente, uma cena com menos pormenores, mas igualmente detalhada. Primeiro plano, a pequena Tatiana com o seu ursinho de peluche num espeto. Segundo plano, alguns dos miúdos. Terceiro plano, a quinta a arder. O segredo aqui está no fogo descontrolado, quase num estilo impressionista. O detalhe não está nas labaredas ou nos seus contornos (até porque não os há), mas nas pinceladas de amarelos, laranjas e encarnados que o direcionam para todos os lados, dando a sensação de estarmos perante um fogo real, em movimento.

 


Algo que o autor tem muito aprimorado é o seu sentido de profundidade, visível na maior parte das suas obras. Mas agora, com a sua mudança propositada de estilo para este álbum, a profundidade parece ganhar outro sentido. E com ela, Louro gera imagens de grande beleza cénica e estética, com ou sem figuras humanas.

 


 
Em termos gráficos, outra característica notável nesta obra é o grande domínio da luz. Os contrastes entre o preto e as cores são extraordinários, como é bem visível ao longo da obra. Por vezes, os múltiplos focos de luz parecem tornar quase impossível a colorização de uma simples vinheta, mas Louro atinge sempre os seus objectivos com mestria. Mas o mais impressionante é o que ele consegue fazer nas cenas em que o fogo tem predomínio ou, ainda mais, nas cenas em que parece brincar com uma única cor e com inúmeras variantes da mesma. No exemplo que se segue, o autor joga com a predominância da cor quente, quebrada com um apontamento de cor fria, como que dizendo ao leitor “o momento de conforto é efémero, pois lá fora o frio e a guerra esperam pelas crianças”. Ao olharmos para uma vinheta de Louro, temos de saber olhar e fazer-lhe a devida vénia.

 


Ao longo da obra há uma prevalência dos castanhos na primeira parte, a referente ao Outono. Uma prevalência dos brancos e azuis na segunda parte, a referente ao Inverno. E uma prevalência dos vermelhos e amarelos quando as cenas são de conflito. E é com esta paleta que o leitor se habitua ao longo da leitura. Mas Luís Louro tem uma mente irrequieta e gosta de brincar com o leitor e de brindá-lo com momentos surpreendentes e chocantes. E desses momentos, o melhor conseguido é aquele em que, ao longo de duas pranchas, muda radicalmente de paleta e oferece-nos o domínio dos verdes numa espectacular aurora boreal.



São muitas as referências que poderia fazer ao crescimento gráfico do autor nesta obra.


Mas é também importante referir que os cânones “luisianos” estão lá todos.


Desde logo, a omnipresença de folhas de Outono, mesmo quando elas já não deveriam existir. É sabido que o Inverno, sobretudo nas latitudes em que este traz a neve, elimina as provas da existência de uma estação anterior. Mas Luís Louro não deixa que isso aconteça desde 1997, ano em que publicou Coração de Papel. Este foi o momento em que as folhas outonais se tornaram uma das suas imagens de marca, independentemente da estação do ano em que decorra a acção das suas obras. Encontrarão exemplos disso em muitas das imagens acima publicadas.


Outro dos seus cânones é o que se pode sintetizar por “mamocas”. Ou seja, a presença constante, desde 1985, de mulheres nuas ou seminuas, altas ou baixas, gordas ou magras, curvilíneas ou rectas. Numa obra como Os Filhos de Baba Yaga, respeitar este cânone é difícil. Mesmo assim, Louro consegue honrar as suas próprias regras e, de forma não gratuita, perfeitamente inseridas no correr da narrativa e no desenvolvimento psicológico dos personagens.

 


Luís Louro costuma também criar personagens que servem como escape da acção ou como aliviadores da tensão narrativa. N’Os Filhos de Baba Yaga esse papel coube à “galinha” Svetlana. Roubada de uma quinta pelos rapazes, o grupo passa todo o tempo da história à espera que ela ponha ovos. Teimosa, recusa-se a fazê-lo, embora tenha razões muito válidas para isso.

 

E, claro está, esta não seria uma obra do autor se não tivesse as chamadas “louro referências”. Ou seja, aqueles pormenores que Louro coloca numa nova obra referindo-se a obras anteriores.

 



Por fim, Luís Louro cria sempre elementos recorrentes nas suas obras. Nas aventuras de O Corvo, é a eterna lua cheia. A lua da fertilidade, pronta a ver nascer, diariamente, o alter-ego do herói, o Vicente.

 

Em Os Filhos de Baba Yaga, os elementos recorrentes são os corvos e as caveiras cravadas em espetos. Se do primeiro elemento não restam grandes dúvidas que se trata de uma homenagem ao Corvo/Vicente, do segundo elemento a leitura não será tão linear. Para mim, e tendo em conta a mensagem maior da história, as caveiras simbolizam o fim de tudo o que nos identifica, sendo que o que fica (os ossos) nos aproxima uns dos outros. E, apesar disso, estas caveiras são identificadas pelos capacetes dos respectivos exércitos ou com a pintura de suásticas ou de estrelas douradas soviéticas.

 

Os Filhos de Baba Yaga é, até à data, a opus magnum de Luís Louro.
 

O cuidado que o autor coloco no processo narrativo, na história em si e em todo o grafismo são epítome disso mesmo. Os extras demonstram a consideração e o desejo de partilha que ele tem para com os seus leitores, revelando técnicas e truques.

 

O recurso a Klavdiya Barsukova, especialista em russo, permite brindar os leitores com expressões em cirílico, recusando notas de rodapé e levando-nos a pesquisar e a entrarmos ainda mais no espírito da obra.


O humor característico de Louro é aqui contido. E o que existe está em total consonância com o tom da história. Quando há, é sobretudo um humor negro.
 

Para bem dos seus leitores e de futuras gerações, Luís Louro soube reinventar-se. Longe vão os tempos de Jim del Monaco (também ele faz 40 anos em 2025) e seria então impensável que, quatro décadas mais tarde, o autor conseguiria criar algo de absolutamente original como fez em 1985.


Mas o que mais me impressiona em Os Filhos de Baba Yaga é a intensidade da mensagem e a maneira como ela é entregue ao leitor.


No momento em que escrevo estas linhas oiço a triste notícia da morte do Papa Francisco. Um homem bom, transversal às sociedades e civilizações, um político apolítico, um arauto da paz, paladino contra as injustiças e profundamente ecuménico. Lutou até ao derradeiro suspiro contra as guerras, fosse através de mensagens serenas e objectivas, fosse com murros na mesa ou diplomacia, mas sempre com esperança.

 

Há variadas maneiras de transmitir a mesma mensagem. O Papa Francisco apelou ao fim das guerras e a uma paz generalizada através do santo exemplo. Luís Louro faz o mesmo em Os Filhos de Baba Yaga. Apela ao fim das guerras dando o exemplo do horror que elas criam, até quando tocam o coração das crianças.


No ano da morte do Papa… Francisco e Luís não podiam estar mais perto. Bem hajam os dois!


Os Filhos de Baba Yaga – absolutamente imperdível!

 

 

Por Francisco Lyon de Castro

 

20 abril, 2025

O novo álbum de Luis Louro!

É esta semana que tem início mais uma edição do festival COIMBRA BD. Promete ser o palco privilegiado para uma série de iniciativas no âmbito da comemoração dos 40 anos de carreira de LUÍS LOURO, um nome incontornável no actual panorama da BD nacional. O ponto alto, claro está, será o lançamento do seu mais recente trabalho, OS FILHOS DE BABA YAGA, numa edição conjunta das editoras A SEITA e ARTE DE AUTOR. O autor leva-nos para o desolador e violento cenário da segunda guerra mundial para uma história de sobrevivência. Um dos álbuns da bd portuguesa mais esperados do ano, e dizem as boas-línguas que já tiveram oportunidade de o ler que está à altura das elevadas expectativas. Para já só me deslumbrei com algumas páginas.
 
Este álbum inaugura um novo e exclusivo selo editorial, Folha de Louro, um nome apropriado para agregar todos os futuros trabalhos do autor com a sua nova editora A SEITA. E as novidades não se ficam por aqui, e este lançamento terá duas capas distintas, uma geral (capa da esquerda) e uma exclusiva (capa da direita) de venda pela plataforma Wook. O álbum já se encontra em pré-venda.
 
OS FILHOS DE BABA YAGA
Até onde podemos ir, quando a nossa sobrevivência está em causa? Estamos na Segunda Guerra Mundial, algures na frente russa, no meio das florestas percorridas por tropas alemãs e soviéticas e marteladas pelo estrondo constante da artilharia e o roncar dos motores dos tanques… onze crianças órfãs juntam-se por necessidade, empurradas pelas circunstâncias, e terão de fazer tudo para sobreviver à guerra, às rivalidades e traições, e ao General Inverno. Até onde poderemos ir quando temos fome? Uma novela gráfica muito dura, de grande fôlego, que mostra como a fome consegue quebrar as fronteiras morais, mesmo entre crianças.
 
Ficha técnica:
Os Filhos de Baba Yaga
De Luís Louro
Capa dura, formato 230x310, cores, 132 páginas.
ISBN: 9789899202344
ISBN: 9789899202375 (capa Wook)
PVP: € 32,00
Edição A SEITA / ARTE DE AUTOR
 

27 março, 2025

Lisboa reconhecida a Luís Louro!

A noticia correu ontem à noite! 

Num ano que promete romper os limites das vinhetas e pranchas, e de ser de justa celebração do seu talento e inestimável contributo para a arte de contar belas histórias através do desenho, o Luís Louro acaba de ser distinguido com a Medalha Municipal de Mérito Cultural, atribuída pela Câmara Municipal de Lisboa.

A proposta, apresentada pelo Presidente Carlos Moedas, foi aprovada por unanimidade, o que sublinha o consenso em torno do reconhecimento do seu trabalho.

Louro é dos poucos autores que souberam captaram com tanta intensidade e magia os encantos de Lisboa. Seja na sua emblemática série O Corvo, na narrativa semi-onírica de Alice, ou nos universos de Sentinel e Watchers, a capital portuguesa surge sempre como um cenário vivo e pulsante, moldado pelo seu traço inconfundível.

Para todos os que apreciam e acompanham a Banda Desenhada, esta distinção é sem dúvida motivo de celebração.

Parabéns a Luís Louro por esta merecida homenagem - um feito inédito no panorama da Nona Arte portuguesa - que coroa uma carreira brilhante, agora a celebrar quatro décadas de criatividade. 

 

04 janeiro, 2025

A capa de Os Filhos de Baba Yaga!

Revela-se aqui a belíssima capa do novo álbum de Luís Louro. No ano em celebra 40 anos de carreira na banda desenhada, e que promete várias surpresas, o autor apresenta Os Filhos de Baba Yaga, uma história que nos transporta para território soviético, durante o conflito da Segunda Grande Guerra. Louro acaba de mudar de editora, e a responsabilidade da edição é agora de A Seita, com lançamento está previsto para o Coimbra BD em Abril. E a avaliar por este magnifico embrulho, só podemos esperar que o conteúdo seja mais um excelente trabalho. Está criada uma enorme expectativa para ler isto!


 

10 outubro, 2024

Está a chegar... O CORVINHO!

Não, não se trata de um livro de banda desenhada, mas eu não podia deixar de trazer aqui. Também não é uma personagem de banda desenhada (ainda que eu reserve a esperança que isso possa acontecer) mas trata-se de O CORVINHO,  a nova estrela dos livros infantis,  a versão criança do nosso conhecido anti-herói alfacinha O CORVO, a genial personagem criada por Luís Louro e que sete álbuns depois celebra 30 anos de existência este ano.

Mas voltemos ao início, ao CORVINHO. Faz amanhã, dia 11, a sua apresentação oficial, em sessão pública, pelas 18.30 horas na Sala do Rei, na Estação Ferroviária do Rossio, em Lisboa. O pequeno Corvinho tem a sua estreia num livro ilustrado. São pequenas histórias infantis para um público mais jovem, adornadas pela candura do Corvinho, com um desenho cativante e cores vibrantes, não vai deixar ninguém indiferente, principalmente os mais pequenos. 

O CORVINHO - O MENINO QUE QUERIA SER HERÓI é um livro para todas as crianças, e porque não para todos os admiradores do trabalho do Luís Louro. A edição é de A SEITA, através da sua chancela Bicho Carpinteiro

Ficha técnica:
O Corvinho - O menino que queria ser herói
De Luís Louro
Capa dura, formato 220x220, cores, 48 páginas.
ISBN: 5600274148672
PVP: € 19,99
Edição A SEITA/Bicho Carpinteiro 

 

02 abril, 2024

Lançamento ALA DOS LIVROS: O Corvo VII - O Despertar dos Esquecidos

Hoje é dia do CORVO!

O CORVO, esse único (e último?) herói da BD portuguesa ainda no activo, está de volta para mais uma inusitada aventura que o levará desta vez dos telhados de Lisboa até ao… RIP. Demonstrando que “velhos são os trapos”, regressa cheio de humor e vigor naquela que é a sua maior história entre todas as que preenchem os seus 30 anos pelos telhados da capital portuguesa.

O DESPERTAR DOS ESQUECIDOS com a chancela da editora ALA DOS LIVROS, é o título da nova aventura, num novo álbum que presta bonitas homenagens aqueles que muito devemos, para além da surpresa, de recordar também todos aqueles leitores que sempre acompanharam a carreira deste super-herói ao longo das últimas três décadas.

O prolífico autor, Luís Louro, não desilude, e brinda-nos neste Corvo VII, com uma recheada narrativa de bom humor, cada vez mais refinado, e um traço carregado de boas doses de espectacularidade. Além disso não esquece o seu activismo, chamando a atenção desta vez, para aqueles que devem merecer sempre a nossa atenção e respeito, ainda que a dura realidade da vida os relegue, muitas vezes, à condição de esquecidos. Arriscaria a dizer que este novo álbum entra directamente para top 3 das melhores histórias do Pardal, desculpem, do Corvo.

O DESPERTAR DOS ESQUECIDOS
O Corvo é um super-herói! E um super-herói está sempre atento aos mais inesperados pedidos de auxílio. Desta vez, a sua busca vai levá-lo a conhecer alguns “residentes” muito especiais. Na companhia dos seus novos amigos, o Corvo encontra um novo propósito que irá mudar a vida de todos. Entre desafios e descobertas, a chegada do “Pardal” vai abalar a rotina dos dias sempre iguais e despertar os que foram esquecidos. Mas será que, afinal, o nosso Corvo vai encontrar quem procura? Muito mais do que uma nova aventura do super-herói menos herói da BD Portuguesa, naquele que é o maior álbum de sempre de O Corvo, esta é uma história emocionante e comovente em que Luís Louro demonstra como o seu universo ainda guarda muitas surpresas e narrativas a explorar. Porque a alegria de viver não tem idade (e a tentação também não…)! 
 
Ficha técnica:
O CORVO VII - O Despertar dos Esquecidos
Argumento e desenho de Luís Louro
Capa dura, 235 x 310 mm , cores, 80 páginas. 
ISBN: 978-989-9108-40-0
PVP: € 19,90 
Edição ALA DOS LIVROS