07 janeiro, 2014

Leituras: As Águias de Roma - Livro IV, de Marini

A minha segunda escolha como leitura do ano de 2013, recai sobre o Livro IVA da colecção AS ÁGUIAS DE ROMA. Uma escolha quase natural, direi eu, uma vez que os primeiros três álbuns desta colecção figuraram com as minhas «leituras de 2011». Entre toda a banda desenhada de matriz fraco-belga publicada actualmente e com regularidade em Portugal, considero esta série aquela que mais se destaca. E são várias as razões.

A principal, para mim, é que se trata do melhor trabalho do seu autor Enrico Marini. Conhecemos a sua arte em Gypsy (ed. Meribérica), Rapaces (Meribérica e ASA), Estrela do Deserto (ASA), O Escorpião (ASA), mas é aqui em Águias de Roma, onde assegura tudo, desde do argumento até as cores, passando pelo desenho, que Marini se revela um autor total.

AS ÁGUIAS DE ROMA é uma série pensada para cinco volumes. Bem estruturada e com um argumento desenvolvido de forma irrepreensível, onde se misturam personagens figuras e factos reais com ficção, versa sobre a expansão do Império Romano para um vasto território, povoado por tribos bárbaras, localizado nas margens do rio Reno, conhecido como Germânia, A acção começa no ano 1 a.C. com Augusto soberano. Roma ocupa partes da Germânia, e vai estabelecendo alianças com as tribos derrotadas. É neste contexto que o príncipe bárbaro querusco Sigmar entrega o seu filho Ermanamer como refém como garantia da aliança com Roma. Entregue aos cuidados de Tito Valério Falco, ao jovem é-lhe atribuída a cidadania romana e o nome de Caio Júlio Arminio, sendo criado e educado nas artes militares conjuntamente com Marco, o filho de Tito.

Fazendo uma síntese dos álbuns anteriores, assistimos ao crescimento e desenvolvimento destes dois personagens e ao evoluir da sua relação de amizade até ao ponto dos caminhos dos dois divergirem. 
 
Arminio é enviado para a Germânia no comando de uma unidade militar afim de terminar com focos de rebelião e restabelecer a ordem com as tribos; Marco apaixona-se por Priscilla, uma mulher comprometida, e na impossiblidade de ficar com ela, dedica-se de corpo e alma à sua condição de oficial militar, sendo o seu esforço e bravura em batalha reconhecido pelo Imperador. É-lhe então atribuída a missão secreta de apurar se a condição de Armínio é de fidelidade a Roma, ou mata-lo caso verifique que é um traidor.

Entretanto em terras germanicas, Arminio começa um perigoso jogo duplo. Age implacavelmente para conter pequenas revoltas, não hesitando em sacrificar os seus, com o intuito de ganhar cada vez mais a confiança do Governador e Comandante das legiões do Reno, Públio Quintílio Varo; em segredo reune-se com os chefes das tribos bárbaras no sentido de se tornar seu lider, dando corpo a uma antiga profecia que falava na chegada de um lider que iria unir todas as tribos da Germânia. Por seu lado, Marco chegado à Germânia, reencontra Priscilla, que acompanha o seu marido Quinto Lépido, comandante da máxima confiança do Governador Varo. O clima é pouco hospitaleiro para Marco, num jogo onde os interesses e os ciúmes imperam, sendo enviado para comandar um posto avançado situado em território hostil. É aqui que se começa a aperceber das movimentações de Armínio e confronto entre «irmãos» torna-se inevitável.



E chegamos ao quarto álbum. A magnifica capa deste já deixa adivinhar que o centro da atenção vira-se agora para Armínio. Este, à vista de Varo, não hesita em castigar implacavelmente todos aqueles que violam as leis romanas, mas na sombra assume-se finalmente como aquele que vai liderar as tribos contra o invasor romano.


Marini gere com mestria toda a sucessão de acontecimentos que irão conduzir as legiões de Varo para o massacre na batalha da Floresta de Teutoburgo (facto verídico). Armínio reúne a confiança máxima do governador. Marco é desacreditado nas denúncias que faz e é acusado de ter morto o lacaio de Varo. Lépido é assassinado durante o sono. E todas as testemunhas incómodas para Armínio são silenciadas. Fica montando o cenário para o quinto e último volume desta colecção.

E é a abordagem de todos estes desenvolvimentos, nas sequências, nos detalhes, complementados com um desenho, e que desenho, forte e expressivo, que não poupa nos pormenores, sobretudo nas cenas de combate, que conduzem o leitor para um ritmo de leitura que não admite paragens. Do melhor da banda desenhada franco-belga.

As Águias de Roma IV
De Marini
Editora ASA, 1º edição de Dezembro de 2013



05 janeiro, 2014

Eusébio (1942-2014)


O dia de hoje fica indelevelmente marcado com a noticia da morte de Eusébio da Silva Ferreira, reconhecidamente uma das maiores figuras de sempre do desporto nacional. Pessoa humilde e futebolista de eleição foi ao longo da sua vida objecto de mais variadas homenagens. Também a banda desenhada nacional homenageou Eusébio, conhecido como a Pantera Negra, quando em 1990 fez publicar justamente o álbum Eusébio, Pantera Negra (ed. Meribérica/Liber) com texto e desenho de Eugénio Silva. É a história de Eusébio, desde do seu nascimento em Lourenço Marques - Moçambique, passando pela suas conquistas ao serviço do Benfica, ao serviço da Selecção Nacional, com especial destaque à sua participação no Mundial de Inglaterra em 1966, até ao fim da sua carreira como jogador. Em jeito de homenagem deixo o momento como Eugénio Silva ilustrou o «nascimento» do Pantera Negra para o futebol. E por todas as vitórias, obrigado Eusébio!




04 janeiro, 2014

Lançamento Levoir: SHDCII 6 - Virtude e Vicío


Mais uma semana, mais um novo volume, o sexto da colecção Super-Heróis DC Comics II. Intitulado Virtude e Vicio centra as atenções nos dois maiores e mais poderosos grupos de Super-Heróis do universo DC. Desta colecção será um dos pouco títulos que não me suscita grande interesse, o que se pode traduzir numa boa surpresa, ou talvez não.


Texto Contra-Capa
No Universo DC existem uma Sociedade e uma Liga que lutam pela Justiça. Separados, são os dois grupos mais poderosos do mundo; juntos, são uma força imbatível para o Bem. Mas, apesar das virtudes dos seus membros, nem por isso deixam de ser susceptíveis aos vícios da humanidade, e quando dois dos mais temíveis inimigos de ambos os grupos unem esforços, os heróis serão postos à prova como nunca antes.
Escrita por Geoff Johns e David S. Goyer, esta história ilustrada por Carlos Pacheco e complementada com a arte de Stephen Sadowski e Don Kramer confere o misto perfeito de acção, mistério e humor neste aclamado encontro entre os dois maiores grupos de super-heróis da DC.

02 janeiro, 2014

A primeira boa noticia do ano!


É o regresso da banda desenhada, em formato de tiras, às páginas de um jornal português. O jornal é o Correio da Manhã, e na parte que interessa a nós bedéfilos, é a grande novidade que resulta da renovação daquele jornal. Serão tiras das mais conhecidas e bem-dispostas personagens de banda desenhada. Assim diariamente teremos de volta depois do Público Calvin e Hobbes, de Bill Waterson juntamente com a companhia de Garfield, o gato de Jim Davis. Na edição de Domingo, junta-se os Peanuts, com Charlie Brown e Snoopy, de Charles Schultz. No meio de tanta tragédia, não faltarão momento de boa disposição nas páginas do Correio da Manhã, no retomar de uma iniciativa que não é inédita neste jornal, porque eu ainda sou do tempo em que as tiras do Fantasma, de Lee Falk eram publicadas neste diário. Um regresso que se saúda neste novo ano!

[actualização] Afinal o regresso da banda desenhada em formato de tiras às páginas de jornais portugueses, não se faz apenas no Correio da Manhã, mas igualmente no jornal i. [Agradeço a informação do Hugo Silva] As tiras de Dilbert, o satírico funcionário de escritório criado por Scott Adam, começaram desde ontem a ser publicadas diariamente na versão em papel deste jornal e também na versão on-line disponivel aqui.

E a primeira BD de 2014 é a Disney Comix 57


A Disney Comix 57 abre o ano e traz logo uma surpresa. A capa não engana. É o regresso da saga Mágicos de Mickey! Desta vez a situação está mais negra, com o poder da coroa a consumir as energias de Mickey e a levá-lo a enfrentar os seus amigos, devido a uns maléficos conselhos vindos da sombra… Mágicos de Mickey II: A Idade das Trevas. Hoje nas bancas!



Com data de lançamento prevista para o último dia de 2013, é certinho que já podemos encontra-la hoje nas bancas. É a Disney Especial Riso. Para começar o ano bem disposto. Reúne histórias tão cómicas que só podiam estar reunidas numa só edição! As trapalhadas de Peninha, com o Donald a aproveitar a sua ingenuidade para lhe pregar uma grande partida, em Peninha e a metamorfose arbórea. Pateta leva os vendedores à loucura com as perguntas mais mirabolantes na história Pateta em: 3x2. E quem é que poderia ser um bom professor… de ladrões?! Pois claro, está-se mesmo a ver que só pode ser o Bafo-de-Onça… Não percas a inauguração da sua escola em Bafo-de-Onça e o master para ladrões!!! E se o mundo Disney tivesse só Donalds, como seria?! Bem, agora já podes saber, basta leres a história Mundo Donald!!! E por falar em Donald… Nós sabemos que ele é azarado, mas dedicar-se a superstições não será um pouco demais??? Descobre tudo em Donald e o ritual de boa sorte! Nas bancas!


E a primeira BD de 2014 é a Disney Comix 57


A Disney Comix 57 abre o ano e traz logo uma surpresa. A capa não engana. É o regresso da saga Mágicos de Mickey! Desta vez a situação está mais negra, com o poder da coroa a consumir as energias de Mickey e a levá-lo a enfrentar os seus amigos, devido a uns maléficos conselhos vindos da sombra… Mágicos de Mickey II: A Idade das Trevas. Hoje nas bancas!



Com data de lançamento prevista para o último dia de 2013, é certinho que já podemos encontra-la hoje nas bancas. É a Disney Especial Riso. Para começar o ano bem disposto. Reúne histórias tão cómicas que só podiam estar reunidas numa só edição! As trapalhadas de Peninha, com o Donald a aproveitar a sua ingenuidade para lhe pregar uma grande partida, em Peninha e a metamorfose arbórea. Pateta leva os vendedores à loucura com as perguntas mais mirabolantes na história Pateta em: 3x2. E quem é que poderia ser um bom professor… de ladrões?! Pois claro, está-se mesmo a ver que só pode ser o Bafo-de-Onça… Não percas a inauguração da sua escola em Bafo-de-Onça e o master para ladrões!!! E se o mundo Disney tivesse só Donalds, como seria?! Bem, agora já podes saber, basta leres a história Mundo Donald!!! E por falar em Donald… Nós sabemos que ele é azarado, mas dedicar-se a superstições não será um pouco demais??? Descobre tudo em Donald e o ritual de boa sorte! Nas bancas!


29 dezembro, 2013

Sketchbook #05 já está on-line


A comemorar o seu primeiro aniversário, saiu agora o quinto número da e-mag Sketchbook Portugal. O grande destaque desta edição vai para uma extensa entrevista a Geraldes Lino, conduzida pelo André Oliveira, que depois de uma exposição dedicada a si no Amadora BD, vem agora e ao longo de 16 páginas passar em revista toda uma vida dedicada à banda desenhada em geral e aos fanzines em particular. A ler. Entre outros artigos interessantes, sugiro a proposta de leitura das "dez mais loucas bandas desenhadas de Natal". Este número da Skectchbook marca o inicio da minha colaboração com a revista em resposta a um desafio do Diogo Semedo. A ideia é trimestralmente falar da bd franco-belga publicada em Portugal. A escolha para abrir a «secção» recaiu sobre o recente álbum Asterix entre os Pictos. Fica o convite para lerem a revista.



Para fazer o download basta seguirem o link:
http://sketchbookportugal.wordpress.com/2013/12/24/sketchbook-portugal-5-download-de-pdf-hd/

Sketchbook #05 já está on-line


A comemorar o seu primeiro aniversário, saiu agora o quinto número da e-mag Sketchbook Portugal. O grande destaque desta edição vai para uma extensa entrevista a Geraldes Lino, conduzida pelo André Oliveira, que depois de uma exposição dedicada a si no Amadora BD, vem agora e ao longo de 16 páginas passar em revista toda uma vida dedicada à banda desenhada em geral e aos fanzines em particular. A ler. Entre outros artigos interessantes, sugiro a proposta de leitura das "dez mais loucas bandas desenhadas de Natal". Este número da Skectchbook marca o inicio da minha colaboração com a revista em resposta a um desafio do Diogo Semedo. A ideia é trimestralmente falar da bd franco-belga publicada em Portugal. A escolha para abrir a «secção» recaiu sobre o recente álbum Asterix entre os Pictos. Fica o convite para lerem a revista.



Para fazer o download basta seguirem o link:
http://sketchbookportugal.wordpress.com/2013/12/24/sketchbook-portugal-5-download-de-pdf-hd/

Lançamento Levoir: SHDCII 5 - Universo DC - Justiça (2)


O 5º volume da excelente colecção Super-Herois DC Comics II (SHDCII), já nas bancas, corresponde ao segundo volume do díptico Justiça, magistralmente assinado por Alex Ross, Jim Krueger e Doug Braithwaite. Pouco mais há a acrescentar aquilo que já disse anteriormente aquando do lançamento do volume anterior. Uma obra que merece ser lida e sobretudo apreciada pelas suas magnificas pranchas. Confiram mais abaixo.

Texto de contracapa:
A confrontação final entre a Legião dos Vilões e a Liga da Justiça aproxima-se, à medida que se revela a terrível conspiração liderada por Brainiac e Lex Luthor, que poderá afectar até os mais distantes cantos da Terra. E os membros da Liga recebem o apoio de quase todos os grandes heróis do mundo, quando o Capitão Marvel, o Adão Negro, os Titãs, a Supermoça e muitos mais se juntam a eles.




28 dezembro, 2013

José Ortiz (1932-2013)


Foi com algum pesar que li a noticia acerca do falecimento do autor espanhol José Ortiz no passado dia 23 de Dezembro. Embora não sendo um daqueles autores com grande obra editada em Portugal, parte do que foi publicado por cá, com a sua assinatura, retenho ainda na memória. Já lá vão umas boas dezenas de anos, e na altura começava a ganhar um enorme fascino pelo Oeste americano. Primeiro na literatura e depois na banda desenhada.

A descoberta da série Grandes Mitos do Oeste, sobre persongens que preenchiam o meu imaginário, publicada nas primeiras páginas da colecção Pantera Negra (Agência Portuguesa de Revistas), com o desenho de Ortiz, num traço rude e pouco dado a pormenores, mas que emanava aquela violência tão característica do Oeste selvagem, ajudou a a consolidar o meu gosto pela temática do western na banda desenhada, anos antes da descoberta de Blueberry.

A colecção Pantera Negra é composta por apenas 10 revistas, publicadas entre Junho de 1977 e Março de 1978, e hoje aproveitei para reler as histórias de Ortiz, num total de cinco, dedicadas a Jim Bowie (Pantera Negra n.º 1), Wyatt Earp (Pantera Negra n.º 2), Billy The Kid (Pantera Negra n.º 3), Buffalo Bill (Pantera Negra n.º 8) e Butch Cassidy (Pantera Negra n.º 10). Ficou-me a faltar Jesse James (Jornal do Cuto n.º 183). Foi um agradável regresso ao passado.

E a melhor homenagem que posso aqui prestar a José Ortiz em forma de agradecimento pela sua arte, é recordar o seu desenho, publicando algumas das suas páginas sobre o Oeste americano, para quem ainda não conhece.

Jim Bowie

Billy The Kid

Wyatt Earp

Buffalo Bill

Butch Cassidy

A última Comix de 2013


2014 só chega para a semana, mas a Disney Comix 56 na sua última edição de 2013, já nas bancas, antecipa a festa! E para celebrar traz histórias festivas e divertidas, tais como Tio Patinhas e a festa a dobrar de fim de ano ou Margarida e a festa do disfarce!!! A família BD Disney junta-se para gritar em uníssono: 3,2,1… FELIZ 2014!!! Por isso, já sabem, não se esqueçam das 12 passas e… da Comix 56!



A última Comix de 2013


2014 só chega para a semana, mas a Disney Comix 56 na sua última edição de 2013, já nas bancas, antecipa a festa! E para celebrar traz histórias festivas e divertidas, tais como Tio Patinhas e a festa a dobrar de fim de ano ou Margarida e a festa do disfarce!!! A família BD Disney junta-se para gritar em uníssono: 3,2,1… FELIZ 2014!!! Por isso, já sabem, não se esqueçam das 12 passas e… da Comix 56!



27 dezembro, 2013

Leitura: Rugas, de Paco Roca

Nota introdutória:
Todos os anos, no inicio de cada, e relativamente ao anterior, em jeito de balanço escrevo a rubrica «revista do ano». Aqui tenho por hábito elaborar uma selectiva lista (5) daquelas bandas desenhadas, cuja leitura, quer seja pela história, quer seja pelo desenho, quer seja por ambos, me deu grande satisfação, motivo pelas quais as elejo como «leituras do ano».

No entanto, nem sempre escrevo aqui no blogue sobre essas leituras, pelo que fica se calhar a faltar qualquer coisa. Assim este ano vou fazer as coisas de forma diferente. A ideia é publicar aqui os cinco textos correspondente às minhas cinco leituras do ano de 2013. Basicamente a razão das minhas escolhas. Sem qualquer ordem especifica, segue-se a primeira: RUGAS



RUGAS do autor espanhol Paco Roca (edição Bertrand) foi uma das minhas primeiras leituras e desde logo uma das melhores. É uma história com uma dimensão humana como poucas histórias em banda desenhada alcançarão. Acompanhamos Emílio. Bancário reformado é portador da doença de doença de Alzheimer. É através dele que entramos numa triste realidade chamada lar de terceira idade. Logo nas primeiras páginas, o autor castiga o leitor com a imagem de alguém que é largado pelo filho naquela que é a sua última paragem antes do fim. Ainda que o tema principal da história seja a doença de Alzheimer, Paco Roca consegue uma articulação entre a doença, a velhice e a amizade, numa abordagem realista com uma linguagem simples mas profunda.


Um destes dias, uma amiga minha contava-me que uma tia dela, com o início da doença, brincava com a situação dizendo que umas das vantagens de se ter Alzheimer, era conhecer novas pessoas todos os dias. É quase no mesmo tom divertido que Paco Rosa aborda aqui a doença. Começa logo pela excelência do desenho da capa desdobrável. A composição gráfica que mostra as memórias de uma vida (representadas pelas fotografias), ao longo de uma viagem de comboio (não poderia haver maior simbolismo) vão saindo desaparecendo da cabeça de Emílio, que mostrando um ar sereno se mostra incapaz de reagir, é de uma singularidade extraordinária.

RUGAS funciona como uma espécie de diário da vivência (e decadência até à chegada do "longo adeus") de Emílio no lar. Numa instituição onde no dia-a-dia todos os dias são iguais, somos apresentados a um universo de personagens (seniores) peculiar e representativas (inspiradas em casos reais) que compõem todo um quadro, e com as quais o autor consegue pautar um arco narrativo de situações que inevitavelmente causam algum desconforto, com bons momento de humor.

Mas RUGAS não conta só uma boa história, serve igualmente de critica social. E é na personagem Miguel, o companheiro de quarto de Emílio, e com quem Emílio divide o protagonismo na história, que o autor faz o "abanar" de consciências, ao dotar-lhe de um cinismo desconcertante, que lhe permite por exemplo definir os velhos como "fardos inúteis da sociedade" (pag. 35) e simultaneamente de uma generosidade e amizade que no final surpreende o leitor.


RUGAS é assim uma obra que olha com respeito para o principio do fim, traduzindo-se num bonito e critico ensaio sobre a velhice, o qual dá gosto ler, o qual dá gosto emocionar. Não há como não gostar.


Rugas
De Paco Roca
Bertrand Editora, 1ª edição de Março de 2013




22 dezembro, 2013

Notas finais sobre o 24º Amadora BD


Este é um texto que andava aqui esquecido em formato rascunho há algum tempo. Trata-se das minhas notas finais sobre a edição deste ano do Amadora BD. Para memória futura publico-o agora.

Achei a 24º edição uma das menos conseguidas dos últimos anos. Encontro uma certa ironia no facto de um festival com o tema central os «Cenários» tenha na concepção e utilização do seus espaços físicos e cénicos o seu ponto mais fraco. Começou pela divisão do Fórum em duas zonas autónomas de exposição sem qualquer ligação directa. Algo de inédito, que eu me lembre, e desprovido de qualquer sentido. Cortou com um espaço que devia ser uno. Qualquer visitante menos atento ou informado sobre a existência de uma outra área de exposições no piso inferior, e certamente terá saído do piso 0 do Fórum Luís de Camões com a sensação de ter visitado o festival de bd mais pequeno do mundo.


No piso térreo, a circulação entre as exposições fazia-se à volta do cenário extravagantemente localizado no centro da sala, permitindo-se assim aos visitantes observar paredes vazias que poderiam, por exemplo, ter expostos trabalhos de autores portugueses que integram o importante e valioso acervo do CNBDI. O que me leva para a segunda nota negativa deste festival. Exposições interessantes mas pequenas. E com raras excepções como a mostra central com as magnificas ilustrações de Ricardo Cabral, a de David Soares (no piso inferior), com um espaço cénico bem construído inspirado na caverna do dragão Wang, o Castrador personagem do livro O pEQUENO dEUS cEGO (Kingpin, 2011) e a dedicada a Mutts, de Patrick McDonell (piso inferior) igualmente com um cenário bem construído e com uma boa mostra de originais, todas as restantes achei pouco conseguidas. Se tomarmos como comparativo a mostra dedicada aos 50 anos do Homem-Aranha (Amadora BD 2012) então as exposições dos 75 anos do Super-Homem e do Spirou foram francamente desinspiradas. A presença do autor americano Jon Bogdanove (autor de The Death of Superman) foi talvez o que se salvou da passagem do super-herói pelo Amadora BD.


No piso inferior, encontrava-se o segundo palco de exposições, e talvez o espaço mais bem conseguido do festival. A zona dos autógrafos. Ampla e aberta, ladeado pelas bancas comerciais, atendendo talvez a pedidos nesse sentido. E aqui dominaram os autores nacionais. Começa a ser uma constante no Amadora BD, tapar a ausência de grandes nomes internacionais com «produto nacional». Felizmente que a acompanhar houve um bom número de novidades portuguesas. E aqui torna-se interessante observar se se trata de uma feliz coincidência ou de um novo fôlego da banda desenhada nacional. Percebe-se que o caminho passa por pequenas editoras e pequenas tiragens. Faltando uma maior divulgação destas obras, neste ponto o Amadora BD realiza-se. Nota positiva.


Em termos de visitantes não me pareceu que tivesse existido um grande acréscimo do número de visitantes comparado com edições anteriores, o que não é bom e que me leva para outro aspecto da edição deste ano. A comunicação/divulgação do festival. A comunicação existiu, mas foi praticamente em cima do acontecimento. A página do facebook do festival (link) com actualizações diárias foi a principal fonte de informação, mas para um festival com a grandeza do Amadora BD pede-se mais. A divulgação nem por isso. Basta passear pela Amadora e verificar como a própria cidade vive alheada do seu festival. O problema está identificado e prende-se essencialmente com a estrutura que organiza o festival, fortemente dependente de uma burocracia camarária, onde qualquer gasto tem ser aprovado por não sei quantas assinaturas, e que na edição deste ano inviabilizou por exemplo a vinda do autor francês Yoann.

Para um festival que apresentou um orçamento a rondar os 600.000 euros, considero que esta edição ficou bastante aquém das expectativas. Penso que se gastou demasiado em cenários e pouco em exposições e autores, quando se esperava justamente o contrário. Segue-se para o ano os 25 anos do Amadora BD, e talvez o momento certo para se começar a repensar o futuro daquele que é o maior, mas não necessariamente o melhor, festival de banda desenhada que se realiza em Portugal.

Uma completa reportagem fotográfica sobre o festival pode ser vista na página do FotoBD. Cliquem aqui para uma visita e façam um «gosto». Recomendo.

Notas positivas:
+ promoção de autores portugueses
+ exposição do Ricardo Cabral

Notas negativas:
- os cenários e a existência de duas zonas autónomas de espaço de exposição
- a mostra dedicada aos 75 anos do Super-Homem
- a comunicação/divulgação do festival

Para finalizar fica o desenho, limpo de quaisquer elementos estranhos, que serviu de base ao cartaz oficial do 24º Amadora BD. Da autoria de Ricardo Cabral que se inspirou em vários locais da Amadora para o desenhar. É aqui apresentado para que possa ser observado em todo o seu esplendor, porque até nisto o festival falhou, ao não disponibilizar aos visitantes sob a forma de cartaz completo aquele que foi talvez o melhor desenho feito para um Amadora BD.