Entre as obras que até agora se destacam no nosso mercado, HOKA HEY! — na magnifica edição portuguesa da ASA — impõe-se como uma daquelas leituras de leitura obrigatória. Logo à primeira vista, salta o grande formato de edição, de generosas medidas, papel de qualidade, porque o traço e a cor do desenho assim o merecem. A imagem na capa, de um índio a cavalo de arma na mão, pode sugerir um western clássico, mas na verdade a obra remete-nos mais para um pós-western.
Estamos em finais do século XIX e o Oeste americano encontra-se conquistado, e o que resta são cicatrizes profundas. As derradeiras tribos nativas, vencidas, encontram-se confinadas às reservas e submetidas a políticas de aculturação. As crianças nativas, separadas à força das suas famílias, são reeducadas segundo os padrões euro-americanos. É nesse cenário de perda, mas também de resistência que o francês Neyef conta-nos uma história de vingança, que é, ao mesmo tempo, de descoberta e de libertação.
No seu estilo gráfico, o autor combina um traço que cruza realismo com uma certa estilização, no qual acrescenta um belíssimo trabalho de cor, criando assim um álbum com uma identidade visual própria.
A narrativa acompanha um pequeno grupo de índios renegados e um irlandês com um passado doloroso. Pelo caminho resgatam Georges, um jovem Lakota arrancado à sua tribo e reeducado como branco, que se vê dividido entre a sua condição e a vontade de se descobrir ao lado dos seus novos companheiros. É este improvável quarteto, composto por personagens fortes que nos cativam, com quem cavalgamos em frente numa viagem sem retorno e com um final inevitável. São as conversas entre estas personagens, nas quais se cruzam memórias, confissões e silêncios, que servem de fio condutor, enquanto avançamos pelos cenários melancólicos das belas paisagens das pradarias e florestas americanas. O ritmo é pausado até a narrativa explodir com vários momentos de violência crua, onde cada gesto tem uma consequência.
HOKA HEY! é de leitura bela e intensa até ao seu final. Neyef entrega-nos uma obra equilibrada, onde a dureza dos factos históricos que nos recorda a responsabilidade do opressor, se mistura com a beleza implacável da paisagem, e onde personagens feridas encontram — ou perdem para sempre — a sua redenção. Sem dúvida que o autor, até agora inédito por cá, tem aqui um excelente cartão de visita para conhecer o seu trabalho. Cinco estrelas. Sem hesitar.
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