20 setembro, 2023

Unicórnios!

No nosso imaginário e por definição temos o unicórnio como uma figura mitológica que tem a particularidade o facto de ser um animal extremamente raro de encontrar. E qualquer coleccionador sabe o bem o valor desta última palavra. Rara é sempre aquela peça muito difícil de encontrar e/ou obter mas pela qual sentimos um enorme desejo de possuir na nossa colecção. Resumindo, será justo a apropriação e considerá-la como… um unicórnio! 

Isto a propósito porque para além de leitor, sou igualmente coleccionador de livros, mais concretamente de obras de banda desenhada. E como qualquer coleccionador que se preze tenho uma boa listagem de alguns unicórnios desejados. Antes procurava-os em feiras de ocasião, de antiguidades, alfarrabistas, mas com o advento das redes sociais, passei a caçador de sofá. As plataformas de venda de produtos usados e grupos de leilões são um terreno fértil. Uma grande variedade e tudo à distância de um clique. E a verdade que se soltaram alguns unicórnios. Edições que procurava literalmente há anos, e que para mim tinham praticamente o estatuto de “mito urbano”, ou seja, ouvimos falar que existem, mas nunca lhe pusemos a vista em cima, começaram a aparecer. Também é verdade que para algumas pediram-me um rim, e não dei. Felizmente para outras a coisa foi mais razoável. 


São quatro os unicórnios que escolhi e que estão entre as entradas raras mais recentes na minha bedeteca. Podemos pensar nos factores que contribuíram para a sua raridade ou dificuldade em encontrar estas edições no mercado. A antiguidade será sem dúvida uma delas, mas há outras:

 
 
Começo pela edição de A Casta dos Metabarões. Esta saga é para mim das melhores coisas de ficção-científica que já se fez em banda desenhada. Saída do universo do “Incal”, é assinada por dois monstros, Jodorowsky no argumento e Juan Gimenez no desenho. A história de uma linhagem de guerreiros lendários, que servem como mercenários a casas nobres que governam o universo conhecido Este quinto volume, Cabeça-de-Aço o Avô, em capa dura, foi editado em 2004 pela Meribérica. A colecção no seu original conta com oito volumes, por cá ficou pendurada aqui. As razões da sua raridade prendem-se eventualmente pelo facto de ter sido das últimas edições da Meribérica, uma vez que editora fechou as portas nesse ano. Uma tiragem reduzida poderá ser uma das principais razões, a que se acresce todos os problemas resultantes da movimentação de stocks de uma editora falida. Depois de uma demanda por mais de uma década(!) para poder ler finalmente este álbum, e um belo dia encontro o álbum, em excelente estado, numa página de vendas de bd pela módica quantia de € 15. Há dias assim! Mantenho a esperança de ver esta saga integralmente editada em português. 
 
Segue-se A Terra sem Mal, de Lepage e Sibran, uma edição de 2003, em capa dura da Vitamina BD. A história de uma europeia perdida numa comunidade indígena na América do Sul que se deixa levar pela tribo numa viagem através da selva em busca de um mundo melhor. Lepage é um autor de quem me lembro sempre das suas magnificas cores nas pranchas da série Muchacho que estiveram em exposição durante o festival Amadora BD de 2009. E este Terra sem Mal escapou-me aquando da sua edição. E voltar a encontrá-lo? Trata-se de outra edição que sofre do mesmo mal da referida anteriormente: a fecho da editora, aqui com a agravante do problema sério relacionado com a falência do distribuidor que ficou com os stocks de livros. E a verdade é que nem naquelas feiras com material da Vitamina BD se consegue encontrar este álbum. Consegui através do insistente contacto com o pessoal da BD Mania, a quem agradeço, terem-me desencantado um exemplar lá do fundo do caixa no mais recôndito dos armazéns.
 
 
 
Continuando, temos o terceiro volume de O Terceiro Testamento, de Xavier Dorison e Alex Alice, uma edição de 2001 pela Witloof. Uma colecção composta por quatro álbuns e, felizmente, toda editada em português, em belas edições de capa dura. Uma história envolvente e magnificamente ilustrada, passada em plena Idade Média, onde um ex-inquisidor tenta desvendar um dos segredos da Igreja. Dorison, já sabemos, é um excelente contador de histórias. Acrescento que a Witloof foi uma editora portuguesa com um excelente catálogo franco-belga, e este Testamento foi uma das suas pérolas. Agora, confesso não conseguir perceber o facto de ser tão difícil encontrar especificamente este terceiro volume, Lucas ou o Sopro do Touro, de seu título, no mercado de segunda mão. Encontra-se muito facilmente em feiras, o primeiro e o quarto volumes, Marcos ou o Despertar do Leão e João ou o Dia do Corvo, respectivamente, e a preços muito acessíveis; o segundo volume, Mateus ou a Face do Anjo, vai aparecendo de vez em quando; agora ver este terceiro volume à venda individualmente é simplesmente raro. Não encontro explicação. O meu exemplar consegui-o num leilão, felizmente para a minha carteira, pouco disputado.
 
Por último, o último que me faltava na magnifica colecção As Cidades Obscuras: Brüsel, de Schuitten e Peeters, numa edição de 1993, em capa mole da Meribérica. A série já se sabe desenvolve-se num mundo fictício de grandes espaços urbanos dotados de cenários arquitetónicos verdadeiramente impressionantes e surreais criados por Schuiten, onde cada edifício tem a sua própria cultura e segredos, e que se assumem invariavelmente como protagonistas de histórias que exploram a relação entre a humanidade e a tecnologia, a preservação da memória e a busca pela verdade. Dos onze álbuns da colecção original (o 12º está previsto sair em finais de Outubro deste ano, e tem edição portuguesa já garantida na colecção Novela Gráfica), em Portugal temos editados dez, por várias editoras. Este Brüsel é o quinto da colecção, e um dos mais difíceis de encontrar a preços ditos razoáveis. A antiguidade aqui conta bastante, porque já lá vão 30 anos desde a sua publicação. Acresce ainda falência da editora, e o nome consagrado dos autores que tem um público dedicado aqui em Portugal (entre os quais eu me incluo), que talvez ajudem a perceber a sua raridade. A minha edição veio de um leilão pouco participado com uma licitação nos últimos minutos para não inflacionar o preço. Finalmente!

Quanto aos restante unicórnios que ainda permanecem na minha lista, vou manter a sua identidade em segredo até porque tenho esperança em encontra-los e preciso do meu rim!

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